Faz quanto tempo? Onze, doze
anos? Nossos valores naquela época eram tão diferentes. Para mim, as duas
coisas mais importantes eram menstruar para virar mocinha e beijar para deixar
de ser criança. Nunca teria dado entre nós dois, Bobby, não me leve a mal, sei
que temos interesses em comum e somos grandes amigos agora. Entretanto, eu não faço
seu gênero e nem você é meu tipo. Apenas a louca da nossa amiga em comum que achou
que algo além da amizade que poderia surgir de nós dois, mas sejamos sinceros, não
estávamos tão desesperados assim.
No outro campo eu fui bem
sucedida, fui a primeira da minha turma a virar mocinha e o mais importante, a primeira
admitir. Lembro que todas falavam “eu não, ainda não” e eu um dia parei e disse
“já, e há muito tempo”. De repente, outras começaram a assumir e a falar e de
repente eu virei uma espécie de guru menstrual. As meninas viam me perguntar
como era, como saberiam quando acontecesse com elas, se eu tinha cólicas. Ah,
as cólicas, era tão chique tê-las. “Hoje eu estou com cólica”, era a prova
definitiva que você tinha dado um passo adiante. Pedir absorvente emprestado
era forma de se colocar como igual, ter absorvente para emprestar era igual a
ter carro importado hoje em dia. Teve uma menina que vibrou e contou para todo
mundo que encontrara sangue em sua calcinha e que era uma mocinha, no dia
seguinte ela apareceu toda triste, no fim era uma espinha. Bobby, eu nunca
engoli essa historia, quem tem espinha lá?
Bobby, eu não sei como eu não fui
a garota mais popular do colégio, não sei como esta oportunidade me escapou e
eu me tornei uma nerd. Acho que eu não vi o próximo step, não agarrei a próxima
oportunidade. Não sei se foram meus óculos, minhas notas altas, ou meu cabelo
despenteado, mas algo me fez perder esse status de guru. Particularmente eu
acredito que foram as escolhas pelas minhas amizades. Nunca gostei de ver alguém
no canto sem falar com ninguém, nunca gostei de ver alguém sendo zuado pelos
outros. Toda vez que aparecia um quietinho na minha sala eu era a primeira a
falar com ela. Se ela tivesse problema para se soltar, eu insistia até nos
tornamos amigas. No meio desse processo, acho que perdi as outras amizades, as
amizades por status. Não me arrependo, acho que sou uma pessoa melhor por isso.
Aos poucos, me tornei a nerd com óculos fundo de garrafa que sempre falou
merda.
Mudei de colégio, Bobby,
continuei sendo nerd, continuei usando óculos, continuei não penteando o
cabelo, continuei não sendo a garota mais popular do colégio e ainda pus
aparelho. Olhando por este lado, é uma dádiva eu ter acabado o colégio com
amigos. E que bons amigos, amigos para a vida, eles trouxeram você de novo para minha vida, desta
vez sem apelidos, com nome mesmo. Tenho fé nos nossos hobbies, Bobby, acredito
que temos boas ideias, mas precisamos refinar a forma. Preciso me dedicar mais,
preciso rever minhas prioridades, Bobby, tem coisas que importam mais do que
status, dinheiro ou absorvente. Eu sabia disso Bobby, mas em algum momento eu
deixei me perder.